Minicaso 2 - Não posso escolher!
Deontológica
O extrato em análise mostra-nos que Sofia está claramente perante uma situação dilemática. De acordo com a filosofia kantiana o facto de cumprirmos escrupulosamente o dever salvaguarda a possibilidade de quaisquer conflitos de deveres; Kant entendia que se no âmbito de uma determinada escolha que o agente moral protagoniza eventualmente exista lugar para regras que se opõem entre si, então não podem ser necessárias ao mesmo tempo.
Sabendo que o conceito de dever é basilar na ética kantiana e que este se define essencialmente como a necessidade das ações do sujeito se orientarem exclusivamente por puro respeito à lei prática que é, desta forma, a condição primeira de uma vontade boa em si, então, podemos perceber que segundo Kant devemos enquanto agentes racionais orientar a escolha das ações que pretendemos realizar essencialmente para aquele princípio fundante que vai de encontro ao puro respeito pelo dever.
Como é óbvio em termos puramente formais é possível entender o projeto kantiano como uma proposta exigente de criar um sistema autónomo assente no conceito de motivação do agente que enquanto entidade racional encontra fundamento na sua vontade para determinar o seu agir ético. Porém, em termos mais práticos percebemos que nem sempre é possível acontecer de uma forma tão linear quanto à partida a teoria kantiana nos poderia ilustrar. No presente extrato “Não posso escolher!” há claramente um conflito de deveres.
Teleológica
Os utilitaristas entendem que as ações são moralmente corretas ou incorretas em função das suas consequências, assim sendo, elas serão avaliadas como boas se promoverem imparcialmente a felicidade para o maior número de sujeitos. Portanto, em rigor, não há ações intrinsecamente boas, deste modo, apenas as consequências as podem avaliar como boas ou más. Os utilitaristas em geral e, especialmente, Stuart Mill, não concebem a existência de deveres que devam ser respeitados incondicionalmente sempre e em todas as circunstâncias, assim justifica-se, por vezes, atos como matar, deixar morrer, roubar ou omitir a verdade.
Para o filósofo inglês, nenhum destes atos é intrinsecamente errado, daí que os deveres que proíbem a sua não concretização, não devem ser considerados como absolutos.
É importante realçar, contudo, que estamos a analisar uma situação marcada por uma intensidade dramática muito evidente, onde as alternativas – permitir a morte de um ou permitir a morte de todos, se configuram como ações vis e, do ponto de vista ético-moral, desprovidas de qualquer respeito pela vida e integridade da pessoa. Ainda assim, o exercício da escolha deve efetivar-se e, de acordo com Mill, se necessário for optar por sacrificar uma vida, pois que seja, se daí resultar bem-estar para o maior número possível. Todavia, é necessário referir que há escolhas que podem ser desumanas e a expressão da protagonista acaba por ser um grito de denúncia contra a moral utilitarista.